sexta-feira, 10 de agosto de 2012

A Virgem e o Cigano (D.H. Lawrence)

Quando a mulher do pároco fugiu, deixando as filhas para trás, deixou, também, ao marido e à sua família um alvo para o seu desprezo. As duas filhas cresceram num ambiente fechado, olhadas, por vezes, com desdém pela estranha família a que pertenciam e que tornou a sua casa (e as suas vidas) num cenário de tédio insuportável. Mas, para Yvette, a mais intempestiva das duas irmãs e a que sonha com uma outra vida, o tédio cedo dá lugar a uma confusão de sentimentos, ao cruzar-se pela primeira vez com um grupo de ciganos. Aí, um homem tomará posse do seu pensamento... mesmo que de nada mais, pois o medo de quebrar as convenções prende-lhe ainda a ânsia de liberdade...
Sendo este um livro bastante curto, é surpreendente a quantidade de possíveis histórias que se cruzam ao longo do enredo. Desde o abandono da mãe de Yvette, às amizades indesejadas por esta estabelecidas, passando ainda pelos meandros da estranha vida familiar do pároco e, claro, pela história da própria Yvette, há, apesar de concentradas num mesmo ambiente e desenvolvidas de forma muitíssimo breve, toda uma vastidão de possibilidades que se cruzam para dar forma a esta narrativa. 
Isto torna-a inesperadamente complexa, já que a conjugação dos vários acontecimentos e personagens define um mundo de contrastes. Contrastes que se evidenciam tanto nas diferentes formas de vida das personagens, mas em como isto as torna insuportáveis umas para as outras. A austeridade que domina o ambiente na casa de Yvette contrasta com o mundo que esta descobre para lá da sua família, mas cria também tensões, devidas tanto aos preconceitos como à sempre referida maldade que a família lhe atribui, por ter nascido de uma mãe que fugiu. O que faz com que esta seja, em certa medida, também uma história de libertação, da vontade de fugir ao peso dos preconceitos e da rigidez das regras, por oposição ao medo e ao quase conforto que paralisa essa mesma vontade.
Estão presentes, portanto, as bases para uma história complexa, quer a nível de ambiente e de histórias que se cruzam, quer nos temas abordados. E é aqui que surge a impressão de algo em falta como resultado da brevidade da narrativa. Ficam demasiadas perguntas sem resposta relativamente às histórias secundárias (principalmente no que diz respeito à mãe de Yvette), e as interacções algo bruscas entre as personagens deixam a sensação de que mais haveria a dizer sobre as suas relações. Fica-se, é certo, com uma imagem bastante clara do ambiente opressivo que caracteriza a família do pároco, e a conclusão da história surpreende pelo inesperado das circunstâncias. Mas fica também a impressão de uma história que, complexa e cativante como é, podia sê-lo ainda muito mais.
Esta é, assim, uma história envolvente, particularmente marcante na forma como reflecte os preconceitos e a barreira dos costumes, enquanto obstáculos para o crescimento e a liberdade pessoal, e que, apesar da impressão de que muito mais haveria a explorar no rumo dos acontecimento, apresenta, ainda assim, uma surpreendente complexidade a nível dos temas abordados. Vale a pena ler, portanto.

Sem comentários:

Enviar um comentário