segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Estação Onze (Emily St. John Mandel)

O dia em que Arthur Leander morreu em palco foi também o dia em que o mundo tal como o conheciam acabou. Talvez seja por isso que, passados anos desde o colapso da civilização, Kirsten Raymonde se lembra tão claramente de Arthur, ainda que muitas outras memórias se tenham desvanecido. Num mundo sem electricidade, sem comunicações, em que a capacidade de viajar ficou seriamente comprometida e em que a vasta maioria das pessoas morreu devido à pandemia, Kirsten é agora parte da Sinfonia Itinerante, um grupo que leva música e teatro às cidades que restam. Mas o que foi até então um percurso razoavelmente seguro torna-se bem mais perigoso quando o caminho da Sinfonia se cruza com o profeta...
História de um possível fim do mundo - ou do mundo depois do fim - este é um livro em tudo diferente das habituais histórias pós-apocalípticas. Diferente em primeiro lugar porque, em vez de abordar a raiz do problema e as possíveis tentativas de o combater, se centra acima de tudo nas pessoas e nas suas vivências do colapso. E diferente também por não atenuar em nada o impacto das circunstâncias. Neste mundo, a pandemia existiu, não houve nenhuma solução de última hora e as consequências foram devastadoras. 
Talvez seja em parte por isso que o impacto da história é tão grande. É que, mais do que a história de um possível apocalipse, este é um livro que fala das pessoas que o viveram. Das que lhe sobreviveram, das que sucumbiram, das que não chegaram a vê-lo acontecer. E no centro de tudo isto há uma teia de relações e de mistérios, delicadamente tecida num equilíbrio brilhante, percorrendo vidas e tempos diferentes para reforçar as relações e as experiências das personagens.
Não se trata, por isso, de um enredo linear. Na verdade, poder-se-ia dizer que tudo neste livro é surpreendente, desde a forma como a autora avança e recua no tempo para traçar os diferentes caminhos das suas personagens à própria evolução do mundo depois da pandemia. Sem esquecer, é claro, a forma como tudo se relaciona no fim, num conjunto de laços plausíveis e surpreendentes.
E há ainda a escrita, também ela brilhante. Fluída, harmoniosa, repleta de frases memoráveis, evoca na perfeição a melancolia das circunstâncias que definem a vida das personagens. Parece, além disso, adaptar-se na perfeição aos momentos que descreve, sejam o desespero de um fim iminente ou a ainda presente esperança de um sonho por concretizar.
É difícil, na verdade, falar deste livro sem dizer demasiado. Mas o que é certo é que, com o seu delicado equilíbrio de histórias e de momentos, as personagens marcantes e as suas vivências do fim, a familiaridade dos medos e esperanças dessas mesmas personagens e a estranha beleza do seu cenário desolado, há algo neste Estação Onze que abala e que comove. E que fica na memória, bem depois de terminada a leitura. Impressionante.

Título: Estação Onze
Autora: Emily St. John Mandel
Origem: Recebido para crítica

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